Frases

13 de dez. de 2016

O presépio de Dona Ana


"Há um menino, há um moleque
Morando sempre no meu coração."
Milton Nascimento

Aprendi a gostar de presépios natalinos ainda menino, com Dona Ana, nossa vizinha que trabalhava como zeladora da igreja católica que fica em frente à casa de meus pais.

Nas semanas antecedentes ao Natal, Dona Ana fervia uma mistura de um caldo negro com um pó brilhante e jogava sobre uma lona de tecido grosso. Eu esperava atento para ver como que aquela mistura na tecido formaria um "céu estrelado" para o presépio da igreja. Quando terminava de "fazer o céu", ela amassava o tecido grosso e carregava para dentro da igreja.

Já na igreja, Dona Ana começada a colocar o feno, os animaizinhos, os anjos, os três reis magos e seus presentes, José, Maria e um "cesto Moisés" coberto com palha (só no dia do Natal que o menino Jesus era revelado!). Dona Ana fazia um sistema de iluminação com várias lampadinhas no chão e por sobre o presépio fazendo com que o cenário ficasse todo iluminado e brilhante por causa da mistura fosca e brilhante no tecido grosso, dando a impressão de que sempre era de noitinha na manjedoura do Senhor. Meu coração de menino se enchia ao ver com meus olhos o presépio do Menino Deus. Que maestria, tinha Dona Ana!

Dona Ana, minha mãe me conta, era analfabeta. Pouco sabia das muitas letras teológicas que fundamentam o presépio que ela com as próprias mãos construía. Era muito pobre, eu me lembro. Porém, aprendi mais com Dona Ana sobre a cena do nascimento do nosso Senhor do que com muitos letrados com os quais encontrei na vida.

Enquanto protestante, faço coro ao lamento de Rubem Alves e pranteio a ausência de presépios nas igrejas evangélicas. Que coisa triste é um natal sem um presépio para ensinar às crianças sobre o nascimento de Jesus! "O presépio nos faz querer 'voltar para lá, para esse lugar onde as coisas são sempre assim, banhadas por uma luz antiquíssima e ao mesmo tempo acabada de nascer. Nós também somos de lá. Estamos encantados. Adivinhamos que somos de um outro mundo.' (Octávio Paz)" (ALVES, Rubem).

Sou grato a Dona Ana por ter me ensinado sobre o Natal sem ter usado uma única palavra. Oxalá tivéssemos outras "Donas Ana" em nossas igrejas para encher os olhos de nossas crianças com a beleza do nascimento do Salvador!

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